Envolvimento de PM
A exemplo de um dos adolescentes que cita um policial militar como sendo a pessoa responsável por planejar todo o crime, Adão acredita que o PM foi o cabeça de tudo. Gleison Vieira da Silva, 17 anos, um dos menores condenados, revelou aos outros adolescentes sobre o envolvimento do policial.
Tido como o delator do grupo, Gleison foi assassinado dois meses depois do estupro coletivo dentro do alojamento do Centro Educacional Masculino (CEM), quando já cumpria a medida socioeducativa.
No início das investigações a polícia ouviu duas das vítimas, as primeiras a terem alta do hospital. Segundo o delegado Laércio Evangelista, as meninas revelaram que os suspeitos falavam que estavam a serviço de "um patrão" e que este as queria. Na época, a polícia colocou Adão como o principal suspeito de ter incentivado os adolescentes durante a sequência de agressões contra as garotas.
O advogado do PM foi procurado, mas até a publicação da reportagem não havia se pronunciado.Condenado em outros processos
O som do abrir e fechar das grades e ao mesmo tempo o silêncio de uma cela solitária. Essa não é a primeira vez que Adão experimenta a reclusão. Natural de Castelo do Piauí, ele foi embora para São Paulo em busca de trabalho no início da década de 1990, quando era adolescente. Foi no estado paulista que deu início o seu enredo pelo mundo do crime.
O primeiro processo veio em 2002, quando foi preso por tráfico de drogas e condenado pela Justiça a cumprir três anos em regime fechado. Na sequência, logo após o cumprimento da pena em 2005, ele foi novamente detido, desta vez por porte ilegal de arma. Adão cumpria a sentença no regime semiaberto quando voltou a ser preso por tráfico. Reincidente, ele pegou uma pena maior: 10 anos, 10 meses e 21 dias de reclusão em regime fechado.
Adão deixou o sistema carcerário em 2013 para cumprir o restante da pena no semiaberto domiciliar, mas se ausentou de São Paulo sem autorização e estava sendo considerado foragido da Justiça quando veio para o Piauí. Ele estava há pouco menos de dois meses em Castelo quando aconteceu a barbárie.
Na cidade natal moram, segundo ele, o pai com 70 anos de idade, doente da próstata, e uma irmã, que cortou relações com ele logo após o assalto à gerente do posto de gasolina. "Ela era amiga da moça e ficou zangada comigo porque eu assaltei e atirei nela. Não fala mais comigo".
Em São Paulo ele diz ter deixado três filhos, sendo duas mulheres e um rapaz. Desde que foi preso e transferido para a Casa de Detenção Provisória de Altos, Adão não recebeu uma só visita de familiares.
"Não recebo visita de ninguém. Meus filhos moram em São Paulo e estudam lá. Meu pai é doente da próstata e anda com uma bolsa do lado (sonda). Minha irmã não fala mais comigo desde o assalto", contou.
Ao final da entrevista, Adão chorou e, ao perguntar se a reportagem seria vista por muita gente, pediu para mandar um recado para o tio que mora em São Paulo chamado por ele apenas de Chagas. "O senhor sabe que eu não faria isso, já fiz muita coisa ruim, mas não estupraria ninguém. Peço que o senhor arrume dinheiro e pague um advogado, porque só estou aqui porque não posso pagar um advogado", falou.
Processo parado no TJ
O processo do estupro coletivo foi dividido em dois: um contra os quatro adolescentes, por serem menores de idade e outro contra Adão José. A Defensoria Pública entrou com recurso porque não aceita que o juiz Leonardo Brasileiro, magistrado responsável por proferir a sentença que condenou os adolescentes, julgue Adão por entender que já houve um pré-julgamento quando a sentença dos garotos foi proferida.
"Por se tratar de réu preso, o Ministério Público fez um requerimento solicitando que o processo principal não ficasse mais suspenso e diante disso já designei uma audiência de instrução na qual vamos coletar todas as provas testemunhais e iremos ouvir vítimas e testemunhas arroladas pela acusação e defesa", falou Leonardo Brasileiro.
O G1 procurou a Defensoria Pública do Estado do Piauí, mas (por telefone) a assessoria do órgão se limitou a dizer que o defensor responsável pelo caso está viajando a trabalho. A reportagem também procurou a defensora geral do estado, Hildete Evangelista, mas ela não quis falar sobre assunto.
Menores alegam inocência
No início das investigações, dois dos adolescentes chegaram a confessar o crime. Agora, eles dizem que a confissão foi feita diante das agressões que sofreram dos policiais no momento da apreensão.
A Defensoria Pública do Estado, responsável pela defesa dos adolescentes, foi procurada peloG1, mas informou que nenhuma declaração será dada sobre esse caso.
Responsável por proferir a sentença, o juiz Leonardo Brasileiro, da Comarca de Castelo do Piauí, disse que todos os depoimentos foram acompanhados pelo Conselho Tutelar e não havia sinais de tortura nos meninos.
O estupro coletivo das quatro garotas e o assassinato de Gleison, delator do crime, dentro do alojamento no CEM não são os únicos atos que pesam contra os garotos. Antes de serem condenados a cumprir medida socioeducativa, todos eles já tinham passagem pela delegacia por arrombamentos, roubos e assaltos.
* Colaborou com a marcação das entrevistas para entrada da equipe na Casa de Detenção Provisória de Altos e produção do vídeo, a repórter Gilcilene Araújo. As imagens são do jornalista Fernando Brito.
Fonte:http://g1.globo.com/pi
Visitas: 1621943
Usuários Online: 1